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17/04/2020

Impactos da COVID-19 nas Finanças dos Condomínios

Impactos da COVID-19 nas Finanças dos Condomínios

Por: Rosely Schwartz

 

A Pandemia, além de afetar o dia a dia dos moradores e trabalhadores de condomínios, tirou a liberdade do uso das áreas de lazer, trazendo uma preocupação muito grande para os gestores, síndicos e administradoras. O orçamento aprovado no início do ano terá que ser avaliado, em função do surgimento de despesas não previstas e da previsão de recessão econômica, que trará desemprego e consequentemente aumento na inadimplência. Desta forma, é imprescindível que os gestores condominiais se preparem para acompanhar todos os dias a movimentação financeira (receitas e despesas) e as medidas que estão sendo adotadas pelos governos.  É fundamental o síndico poder contar com o apoio da administradora na análise e proposição de alternativas para as situações que irão surgir.

 

As publicações das Medidas Provisórias – MP nº 927, de 22 de março de 2020 e a MP nº 936, de 01  de abril de 2020 trouxeram algumas propostas que irão afetar a gestão dos funcionários, que devem ser analisadas e implementadas com bastante  cautela, em função de haver divergências de opiniões entre os juristas. É recomendado que o síndico consulte o jurídico da administradora antes de aderi-las.  Lembrar da importância dos funcionários, da nossa função social, e da necessidade, principalmente neste momento, de serem preservadas a segurança e a limpeza do condomínio.   Assim, é preciso mantê-los motivados, amparados, sendo a redução do salário e a demissão as últimas alternativas, quando realmente não houver outra opção possível.

 

Seguem abaixo alguns itens que poderão auxiliar os gestores na avaliação da situação financeira do condomínio diante da crise:

 

Orçamento aprovado para 2020 – Deve-se analisar profundamente as receitas e as despesas para realizar os ajustes necessários e no tempo adequado, sendo impossível, neste momento, aumentar o valor do condomínio. Seguem abaixo alguns itens que devem ser estudados:

 

  • Inadimplência – Apontar os valores e número das unidades que estão inadimplentes antes da Pandemia e quais são as unidades que nunca estiveram na lista e que, no mês de março e abril, deixaram de pagar. Essas informações são muito importantes para que o síndico acompanhe a tendência, o percentual de crescimento, dado que o resultado irá impactar diretamente nos compromissos já assumidos para o pagamento das despesas. Algumas iniciativas podem ser adotadas:
    1. Comunicado para os moradores – Alertá-los que a quota condominial precisa ser paga dentro do prazo para evitar multas e cortes de serviços, como: folha de pagamento, encargos sociais, elevadores, água e energia;
    2. Redução do valor do condomínio – Haverá a pressão dos moradores para que o valor da quota seja reduzido. O síndico deverá ter o argumento sobre a impossibilidade de redução, em função do aumento das despesas, como água, energia, materiais de limpeza, sacos de lixo e os contratos já assumidos;
    3. Pagamento da quota com desconto – Alguns conselheiros poderão sugerir essa alternativa, a qual não é considerada legal, já que traz, de forma indireta, o aumento no valor da multa pelo atraso fixada em até 2%, pelo Código Civil;
    4. Parcelamento das quotas em atraso – O síndico deve entrar em contato com todos os moradores e marcar reuniões individuais, junto com o conselho (tomando todos os cuidados, como distanciamento e o uso de máscaras, podendo ser até por Skype ou outro meio digital) para colocá-los a par da situação preocupante que o condomínio está enfrentando. De acordo com a justificativa de cada um, propor acordos e parcelamento da dívida, que, sendo feito extrajudicialmente, sem o auxílio de advogado, não haverá honorários advocatícios. A multa, os juros e a correção monetária não poderão deixar de ser cobrados, por conta das determinações fixadas em convenção, sendo o síndico eleito justamente para cumprir essas determinações. Somente o percentual da correção monetária poderá ser negociado. Mesmo que haja a pressão dos moradores para que o síndico faça os acordos que descumpram a convenção, ele deve agir dentro das normas, preservando a sua responsabilidade de cumprir a convenção, para evitar que no futuro seja questionado sobre as ações adotadas, mesmo que o período seja totalmente atípico. É possível alterar a convenção, sendo necessário a aprovação com o quórum de 2/3 da totalidade dos proprietários. Como no momento não é possível realizar assembleias presenciais, o síndico poderá recorrer às assembleias virtuais, usando as tecnologias já disponíveis, como, Google Hangouts ou Zoom. Para os moradores que não possuem o conhecimento para o uso destes dispositivos, poderão emitir o seu voto por meio de procuração, com finalidade específica. Os resultados desta assembleia deverão constar de uma ata, que deverá ter a assinatura dos participantes para viabilizar o registro.

 O conhecimento e o controle diário contribuem para que os gestores realizem os ajustes necessários nas contas.

 

  • Contratos já firmados - Verificar a possibilidade de negociação com os prestadores de serviços, entre eles: elevadores, bombas, CFTV e administradoras, para que haja redução no valor das faturas neste período de pandemia e alterações dos vencimentos. Outra questão é solicitar o adiamento do reajuste previsto para os próximos meses, ou até a suspensão dele. Deve-se registrar os acordos realizados, por meio de aditamento ao contrato existente, tendo obrigatoriamente as assinaturas dos envolvidos;
  • Manutenções e serviços planejados – Deverão ser realizados apenas os emergenciais, mesmo que tenham sido aprovados em assembleia;
  • Energia e água – Registrar diariamente os consumos, dado que os moradores estão 24 horas em casa, 7 dias por semana. Comparar com os meses anteriores à crise. Lembrar aos moradores, por meio de circulares, aplicativos ou mesmo pelo interfone, a necessidade do uso racional da água, pois o aumento irá afetar o consumo de energia pela ativação mais frequente das bombas de recalque. Lembrá-los que a mudança da faixa de consumo de água implica em uma grande elevação no custo, impactando diretamente no orçamento;
  • Funcionários – O síndico, além do fornecimento dos EPIs e outros cuidados com a saúde dos colaboradores, deve analisar o quadro de funcionários junto à administradora, horário de trabalho e a possibilidade de redução da jornada, por exemplo, para os faxineiros e zeladores ou gerentes prediais. Lembrando mais uma vez que a dispensa somente deverá ocorrer quando o condomínio realmente não tenha condições de arcar com a despesas básicas, como: água, energia, elevadores e segurança.

Para reduzir os gastos com salário, pode-se cortar as horas extras.  No entanto, se essas horas eram feitas com habitualidade precisarão ser indenizadas, de acordo com o cálculo da supressão de horas extras. Já as férias deverão ser pagas dentro do estabelecido em lei, ou seja, trinta dias, sem que o funcionário tenha direito ao abono pecuniário de 1/3 (recebimento em dobro por trabalhar 1/3 dos dias que ele terá direito). Desta forma, ele irá descansar 30 dias, sem aumentar a despesa para o condomínio. Outro ponto que pode ser acordado com os funcionários que saírem de férias, neste período, é deixarem de receber a metade do 13º Salário, visando manter esse valor no caixa do condomínio, dado que poderá faltar recursos no futuro.

 

Avaliar com muita cautela as medidas propostas pela MP 927/2020, que poderão ser aplicadas ao condomínio, entre elas estão:

 

  1. Antecipação das férias – Poderá ser aplicada, por meio de acordo individual, principalmente para os funcionários que estejam no grupo de risco. O prazo de aviso é de 48 horas. O síndico deve verificar o efeito que essa ação terá na escala de trabalho, pois poderá gerar necessidade de maior número de horas extras. Neste caso, analisar a possibilidade de contratar um trabalhador temporário, sendo essa ação aprovada junto ao conselho e os recursos advindos dos Fundo de Reserva;
  2. Banco de horas – Pode ser estabelecido por meio de acordo coletivo ou individual, sendo necessária a formalização por escrito. A compensação deverá ocorrer no prazo de dezoito meses, contados da data de encerramento do estado de calamidade pública. A compensação de tempo poderá ser feita mediante prorrogação de jornada em até duas horas, a qual não poderá exceder dez horas diárias. A compensação do saldo de horas poderá ser determinada pelo empregador independentemente de convenção coletiva ou acordo individual;
  3. Exames médicos ocupacionais (NR 7) - Suspensão de exigências administrativas em segurança e saúde no trabalho, exceto os exames demissionais. Os exames serão realizados no prazo de sessenta dias, contados da data de encerramento do estado de calamidade pública;
  4. Diferimento do recolhimento do Fundo de Garantia do Tempo de Serviço – FGTS - referente às competências de março, abril e maio de 2020, com vencimento em abril, maio e junho de 2020, respectivamente. O recolhimento das competências de março, abril e maio de 2020 poderá ser realizado de forma parcelada, sem a incidência da atualização, da multa e dos encargos previstos. Esses meses poderão ser quitados em até seis parcelas mensais, com vencimento no sétimo dia de cada mês, a partir de julho de 2020. Para usufruir da prerrogativa mencionada, o síndico deverá buscar a administradora para que seja feita a Declaração com as informações à Caixa Econômica, até 20 de junho de 2020.

A MP 936/2020, publicada em 02/04/2020 trouxe algumas possibilidades para manter o emprego e a renda dos funcionários, mas também é vista pelos juristas com vários pontos polêmicos, inclusive sobre a sua constitucionalidade. No dia 06/04/2020, o ministro Ricardo Lewandowski, do Supremo Tribunal Federal (STF), estabeleceu que os acordos individuais de redução de jornada de trabalho e de salário ou de suspensão temporária de contrato de trabalho somente serão válidos se os sindicatos de trabalhadores forem notificados em até 10 dias e se manifestarem sobre sua validade.​ Segundo a decisão, que será submetida a referendo do Plenário, a não manifestação do sindicato, na forma e nos prazos estabelecidos na legislação trabalhista, representa anuência com o acordo individual.

 

Diante deste quadro de insegurança jurídica, o síndico antes de adotar qualquer iniciativa deverá buscar amparo legal e consultar um advogado da área trabalhista, visando evitar futuras ações. Seguem abaixo as principais considerações sobre o item que aborda a redução proporcional de jornada de trabalho e de salário:

 

  1. O limite de tempo para a aplicação da redução será de 90 dias;
  2. A redução prevista na MP poderá ser de 25%, 50% e 70%, podendo o síndico acordar percentuais menores, como: 10% e 20%. A Medida prevê que a redução de 25% poderá ser negociada diretamente com os empregados que recebam salário de até 3.135,00, ou empregados com curso superior e recebam salário de R$ 12.202,12 ou mais.

 

No entanto,  é importante lembrar que a Constituição Federal, Art. 7, VII e XIII, ambos incisos determinam a irredutibilidade do salário e da jornada, salvo previsto em convenção ou acordo coletivo, e a CLT, Art. 503, coloca restrição à redução dos salários, sendo apenas permitido em casos de força maior, não podendo ser superior a 25%. Desta forma é fundamental que o síndico avalie com muita cautela a adoção desta alternativa, consultado, inclusive, o sindicato;

 

  1. O acordo individual escrito entre empregador e empregado, deverá ser encaminhado ao empregado com antecedência de, no mínimo, dois dias corridos;

 

  1. Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda – Os funcionários terão direito de receber esse benefício quando houver o acordo entre empregador e empregado para a redução da jornada e salário, sendo este custeado pela União. Deve-se observar as seguintes disposições: 1) as parcelas serão mensais, devidas a partir da data do início da redução da jornada de trabalho e de salário; 2) a adesão deverá ser informada ao Ministério da Economia no prazo de dez dias, contados da data da celebração do acordo; 3) a primeira parcela será paga no prazo de trinta dias, contados da data do acordo; 4) o Benefício Emergencial será pago exclusivamente enquanto durar a redução proporcional da jornada e de salário; 5) por meio de Ato do Ministério da Economia será disciplinado a forma de transmissão das informações, concessão e pagamento; 6) o benefício terá como base de cálculo o valor mensal do seguro-desemprego, conforme tabela abaixo, a que o empregado teria direito, aplicando o percentual que será calculado na redução de jornada de trabalho e de salário.

 

Valor do Seguro-Desemprego para 2020

Faixas de

Média Salarial

Forma de Cálculo

Salário Médio

Até

R$   1.599,61

Multiplica-se salário médio por 0.8 = (80%).

De

R$  1.599,62

A média salarial que exceder a R$ 1.599,61 multiplica-se por 0,5 (50%) e soma-se a R$ 1.279,69.

Até

R$ 2.666,29

Acima de

R$ 2.666,29

O valor da parcela será de R$ 1.813,03, invariavelmente.

 

É importante lembrar que a Medica Provisória 905/2019 estabeleceu que, a partir de 1º de março de 2020, sobre os valores pagos ao beneficiário do seguro-desemprego, será descontada a respectiva contribuição previdenciária. Devido a esse desconto, o período será considerado para efeito da concessão da aposentadoria.

 

A MP também prevê a suspensão temporária do contrato de trabalho, por no máximo 60 dias, tendo o funcionário direito aos benefícios concedidos pelo empregador, como: vale alimentação, vale refeição, e até o vale transporte. Terá direito ao Benefício Emergencial de Preservação do Emprego e da Renda, conforme já mencionado acima. Essa alternativa também deverá ter a anuência do sindicato, reforçada pela deliberação do STF. O síndico e conselheiros devem avaliar o impacto que essa decisão terá na vida dos colaboradores, principalmente neste momento de muito temor e incertezas.

 

Fundo de Reserva e Benfeitorias – Levantar o valor real que o condomínio tem aplicado nestes Fundos, visando cobrir, neste momento, a falta de recurso para pagar as despesas e eventuais emergências. O síndico dever estar atento, pois havendo o agravamento da crise econômica e o aumento do desemprego entre os moradores, mesmo fazendo os cortes de muitas despesas e renegociação de contratos, o condomínio poderá, a curto prazo,  ter dificuldades para o pagamento das contas, tornando a Conta Condomínio negativa.

 

Para evitar questionamentos futuros é importante que o síndico tenha, a princípio, a aprovação dos conselheiros para poder transferir o valor necessário para cobrir o saldo da conta corrente. Os moradores devem ser informados destas necessidades, por meio de circulares, ou aplicativos, e logo que for possível convocar uma assembleia presencial para justificar os gastos. Deverá constar da pauta a ratificação das ações e comprovação da necessidade do uso do Fundo de Reserva ou do Fundo de Benfeitoria. Desta forma, os moradores poderão optar se irão aprovar um rateio para recompor o valor utilizado, ou a arrecadação mensal já cobrada é suficiente para repor o valor utilizado, mesmo que o prazo seja longo.  

 

Empréstimos bancários – Alguns bancos estão oferecendo linhas de crédito aos condomínios, sendo exigidas garantias para a liberação da operação. É uma opção que deve ser analisada com muita atenção, em função de haver a necessidade de aprovação em assembleia. Para que o síndico tenha respaldo nessa decisão, é recomendado que o quórum para aprovação seja superior a 50% da totalidade da massa condominial e não apenas dos presentes.  Neste momento de pandemia não é possível realizar a assembleia presencial; o síndico deverá organizar uma assembleia virtual atendendo às referências apontadas no Projeto de Lei 1.179/2020, o qual já foi aprovado pelo Senado em 13/04/2020 e encaminhado para aprovação da Câmara dos Deputados.

 

Receita garantida – Essa opção de obter a antecipação das receitas mensais do condomínio com o desconto de um percentual cobrado pelas empresas de cobrança precisa ser analisada com muita atenção e ser avaliada por advogados especialistas na área condominial, em função de haver muitas divergências de opiniões, até mesmo sobre a legalidade de alguns contratos e possíveis prejuízos que poderão trazer para o condomínio. Além disso, é preciso ter a aprovação em assembleia, com quórum qualificado de no mínimo 2/3 da totalidade da massa condominial, para alterar a forma prevista em convenção. Outro ponto que deve ser analisado é que o percentual cobrado pelas empresas deve estar previsto nas despesas que compõe o orçamento anual. É importante lembrar que o percentual que deixar de entrar como receita para o condomínio será definitivo, o que não acontece quando a cobrança é feita pelo próprio condomínio por meio de ação normal de cobrança. Essa alternativa pode gerar demora para o condomínio receber, mas o valor retornará com o pagamento da multa, juros e a correção monetária, sendo apenas descontado os honorários advocatícios.

 

A qualidade da administração e a eficiência no controle financeiro serão evidenciadas de forma clara neste momento, resultando em equilíbrio das contas e tranquilidade para os moradores. Ter uma empresa administradora realmente parceira será determinante para o sucesso da gestão.

 

Todos estamos torcendo para que este momento na história da humanidade passe o mais rápido possível e que as consequências sejam superadas com brevidade.

 

Profa. Rosely Schwartz - Autora, coordenadora do Curso de Administração de Condomínios e Síndico Profissional – presencial – FECAP e online – OCONDOMINIO. Autora do livro Revolucionando o Condomínio – 15ª Edição – Editora Benvirá.

 

Fonte: O Condominio


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